sexta-feira, 22 de março de 2013

Será o fim do papel? (2ª Parte)


Terminei o post anterior com a afirmação de que há um campo em que o papel ainda parece resistir bravamente: a publicação de livros. E deixei a pergunta final: continuaremos a ler livros em papel?
Diferentemente do setor jornalístico, que, como se sabe, obtém receita pela publicidade, publicações autorais dependem da venda de exemplares.
Para o modelo de negócios do setor jornalístico, portanto, parece mais fácil encontrar guarida na Internet ou em outros formatos digitais. Isso porque a preocupação com a proteção do conteúdo não é algo tão relevante. Afinal, notícias ficam velhas logo. Ser capaz de vender jornais e revistas é importante para que o anunciante saiba qual o público que conseguirá atingir com a propaganda neles veiculada. Nos dias seguintes, aquele material todo não tem muito valor para a empresa de notícias (como também para o leitor!): a receita virá dos anúncios feitos nas edições seguintes.
No ambiente literário, entretanto, as coisas são diferentes. Autores, seus editores e o restante da cadeia econômica, que inclui distribuidores e livrarias, são remunerados pela venda dos exemplares dos livros, que, por sua vez, são produtos de utilidade muito mais duradoura do que jornais.
De certo modo, assim como para o mundo das notícias, o livro em papel ainda não morreu por dois motivos: o hábito inercial dos leitores e a falta de um modelo de negócio sustentável. Igualmente, se pensada apenas a eficiência da distribuição (como me referi no post anterior), o papel será surrado pelo meio eletrônico.
Por várias vezes na última década, no ambiente acadêmico, sustentei entre meus pares que já não havia sentido publicar revistas científicas em papel, a menos que houvesse ali alguma finalidade econômica. Instituições de ensino que apenas desejam divulgar sua produção científica – e invariavelmente costumam distribuir de graça, ou a preço de custo, os seus periódicos – não têm qualquer razão para continuar a publicar revistas em papel. A Internet permite reduzir o custo da publicação e ao mesmo tempo atingir um universo ilimitado de leitores, que podem localizar os artigos a partir das populares ferramentas de busca, vantagens que a restrita edição em papel jamais proporcionaria.
Quando, porém, a publicação de um livro ou revista de artigos é motivada por interesses também econômicos, tanto de seu autor como do restante da cadeia econômica correlata, o meio digital ainda parece ser um assustador pântano de dificuldades práticas.
O problema da migração para o livro digital reside na facilidade de replicação dos arquivos gerados nesse formato. O papel atua, no caso dos livros, não apenas como um mero suporte para transmissão da palavra: é também uma forma de controle e proteção sobre o produto econômico. Além, claro, da proteção legal aos direitos autorais, a reprodução ilícita de um livro sempre enfrentou outros óbices práticos que ajudavam a inibi-la: o custo da fotocópia em papel e a pior qualidade do resultado final. Melhor pagar por um livro do que por uma horrível resma de papel borrado e torto...
cerca de vinte anos, quando gravadores de CDs tinham custos proibitivos (se minha memória não me trai, quando foram lançados no Brasil custavam mais de 2 mil dólares) e os também caros discos rígidos dos computadores pessoais tinham capacidade em torno de uns 100 Mb (menos de um sexto da capacidade de um CD), a publicação de revistas de jurisprudência em CD-ROM pareceu ser um porto seguro para o editor. Lembro-me de ter adquirido duas ou três revistas neste formato, que já apresentavam largas vantagens sobre o papel, especialmente por não ocuparem prateleiras inteiras: uma centena de revistas do STJ cabia num pequeno disco de plástico! Claro, nos dias de hoje a distribuição de livros em um CD comum não representa qualquer proteção física para o editor.
Surgiram então, as tecnologias DRM (Digital Rights Management, ou Gerenciamento Digital de Direitos): técnicas que procuram impedir a duplicação de conteúdo digital. São tecnologias controvertidas, que enfrentam vigorosa oposição. Mas, à parte esta questão de cunho mais propriamente político, sem dúvida parece ser necessário encontrar um ponto de equilíbrio na proteção autoral de conteúdo digital.
O problema prático de algumas tecnologias DRM, especialmente as primeiras que surgiram, é que elas tornavam o livro digital um produto muito menos desejável do que o livro em papel. Apoiando-me apenas no que minha lembrança permitir (nem faço ideia de como recuperar essas informações perdidas no tempo, senão pela minha memória e a dos amigos leitores que quiserem colaborar...), recordo-me de ter visto ao longo dos anos alguns produtos com proteções tão complexas e restritivas que não despertei por eles o mesmo interesse que tive, por exemplo, em comprar a Revista do STJ em CDs, em meados dos anos 90.
Via de regra, os produtos eram registrados com códigos que os vinculavam a especificações de hardware de um determinado computador. Lembro-me até de um produto – só não consigo rememorar qual foi – que ainda vinha acompanhado de um pequeno aparelho a ser conectado na porta serial (ou seria na porta paralela?) do computador. O problema é que tais mecanismos não só impediam o uso do produto em outro computador também seu, como ainda causariam problemas quando da substituição ou manutenção daquele computador em que os livros ou revistas foram instalados. Se fosse necessário substituir o disco rígido, por exemplo, isso invalidaria o produto instalado... Um livro em papel, convenhamos, nos oferecia maiores possibilidades de uso.
Eram tempos pré-Internet...
A popularização da Internet e, especialmente, a sua constante melhoria de qualidade e velocidade da conexão, aliada à proliferação de dispositivos móveis capazes de acessá-la, parece abrir finalmente um campo promissor para modelos de negócio que consigam contrabalancear de modo mais equânime os dois interesses em jogo: a proteção do conteúdo e os direitos do leitor que adquiriu justamente um exemplar da obra. Sem isso, não haverá produtos viáveis, seja porque os leitores não se interessarão por eles, seja porque ficará comprometida a receita do autor.
A tecnologia tem buscado novos caminhos. Retomei meu interesse pelo tema neste início do ano de 2013 e tentei conhecer um pouco mais as novas opções disponíveis.
Estou tentado a afirmar que o livro em papel começou a morrer.
Continuo no próximo post.

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