sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Interrogatório por videoconferência: um equívoco disfarçado de modernização

Com a promulgação da Lei nº 11.900/2008, a videoconferência de presos volta ao centro das discussões. A OAB-SP tem insistentemente se posicionado contrária a tal medida, não porque resiste à inovação tecnológica ou à modernização do Poder Judiciário, que representam anseios da Advocacia nacional, mas porque a informatização do processo judicial deve respeitar as garantias constitucionais e processuais.

Em recente artigo, que assino em co-autoria com Luiz Flávio Borges D'Urso, publicado no Consultor Jurídico (leia aqui), procuramos mais uma vez ressaltar os problemas trazidos pelo polêmico interrogatório por videoconferência, merecendo destaque as dificuldades práticas que trará para a defesa do acusado.

A informatização da Justiça brasileira caminha claudicante, sem verbas suficientes para torná-la mais ágil e eficiente e, no entanto, serão feitos investimentos em uma extensa rede de sistemas de videoconferência, que permitam conectar todos os presídios a todas as Varas Criminais do Estado. E isso não vai custar barato! Não bastasse ser terrível contrapor motivos de ordem econômica como compensadores dos prejuízos causados ao direito de defesa, ainda parece evidente que o argumento é falacioso. Não se vislumbra a alardeada economia.

O transporte de presos não vai terminar e, portanto, continuarão a existir tanto o seu custo financeiro como os seus riscos. De um lado, o interrogatório por videoconferência, tal como previsto na nova lei, é medida excepcional que, se cumprido o seu texto, haverá de ser realizado em percentual mínimo de casos. Noutras palavras, serão feitos investimentos em equipamentos e canais de comunicação que permanecerão ociosos grande parte do tempo. De outro lado, certamente ainda haverá transferência de presos de um local para outro, que não o Fórum.

É curioso notar ainda que, se o Estado pensa em fazer economia, para o acusado o custo do processo aumentará. Seu defensor precisará se deslocar para o presídio, que pode eventualmente não estar localizado na mesma Comarca em que corre o processo, onde em regra o Advogado estaria estabelecido. Nas circunstâncias em que a videoconferência é realizada, com acusado de um lado e juiz, autos, testemunhas e estrutura judiciária de outro, uma boa atuação envolveria a presença de Advogados em ambos os locais, e com capacidade de falarem entre si por um canal privativo, mas é claro que esta é uma opção impossível para o orçamento da imensa maioria dos réus presos. E, pergunta-se, quem cobrirá estes custos quando o réu for defendido pela Assistência Judiciária, situação que atinge a imensa maioria dos réus presos?

Muitas dificuldades que nossa Justiça enfrenta poderiam ser tratadas com um uso mais eficiente da tecnologia, mas faltam-lhe recursos para tanto; contudo, recursos volumosos serão gastos com equipamentos voltados à prática de um único ato processual, que só ocorre uma vez por processo, e só funcionarão em uma parcela minoritária de casos, os de presos perigosos ou enfermos. Não é difícil perceber que a solução mais simples, realmente mais barata e que, principalmente, atenderia ao princípio da ampla defesa, seria deslocar o Juiz ao presídio.

Nem sempre o emprego de tecnologia é a solução correta para um dado problema...

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Meu escritório embaixo da árvore

O ano de 2009 se inicia e, como sempre, mais novidades tecnológicas virão. Cada vez mais, as tendências apontam para a mobilidade. Nos últimos meses, notebooks despencaram de preço, mas podem sofrer uma concorrência inusitada: a dos celulares.

Passei a virada de ano com o aparelho da foto, que recebi da própria Nokia, a fim de testá-lo por um mês (ser meio "nerd" tem lá suas vantagens...). É um dos modelos "top de linha" da marca, com uma tela maior, funções multimídia e o mesmo poder dos computadores que tive no final dos anos 90. Impressiona ver o quanto meros telefones estão se tornando computadores potentes.

Matéria publicada no UOL ("De travar o carro a pagar contas: saiba o que o seu celular vai fazer") abriu o novo ano relacionando os múltiplos usos previstos para essa tecnologia móvel. Merece destaque, na notícia citada, o uso do celular como meio de pagamento. Embora não haja menção a isso na reportagem, tal funcionalidade deve necessariamente envolver o uso de assinaturas digitais.

Venho dizendo há anos que a única maneira de se pensar em dar portabilidade com segurança ao uso de assinaturas digitais exigiria que o signatário carregasse consigo não apenas a chave de assinatura, mas o seu próprio sistema gerador de assinaturas, que lhe permita conferir por seus meios aquilo que vai assinar. Confesso que sempre fiz tais afirmações pensando no uso de palmtops e não escondendo algum ceticismo quanto ao uso maciço deles pela população... Mas agora temos os celulares como uma alternativa viável, pois estão se tornando muito populares e contam com suficiente poder de processamento para tais tarefas.

Preocupa-me, no entanto, a idéia de deixar chaves privadas de assinatura guardadas em dispositivos permanentemente conectados. A questão da segurança contra apropriação indevida da chave precisa ser muito bem analisada e discutida.

Como advogado, por outro lado, fico inevitavelmente pensando no que mais, além de falar, um celular poderia nos servir no exercício profissional. Acessar de qualquer lugar os websites de uma Justiça que cada vez mais estará online é sem dúvida a utilidade mais evidente. E na medida em que o escritório também possa ser acessado pela grande rede, teremos a sensação de levá-lo no bolso.

Sinto a falta de melhores aplicativos para escritório para usar no celular. Certamente virão. A dúvida é se serão softwares instalados no aparelho ou aplicações que rodarão na web, naquilo que vem sendo chamado de "computação em nuvem". Em 2009, talvez já apareçam algumas respostas.

Durante uma viagem de férias, uma década atrás, ao passar por uma bela árvore em meio a um convidativo gramado, brinquei com minha esposa que um dia, com um notebook, Internet e assinaturas digitais, poderia mudar meu escritório para aquela deliciosa sombra. Conforme o tempo passa, fica difícil saber com que tipo de aparelho irei trabalhar ali.