sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Do direito dos animais ao direito dos andróides

Com o fim de ano chegando e um sabor de férias na boca, permito-me adentrar uma discussão um pouco mais, digamos... descontraída. Chego em casa, na sexta-feira, vindo de uma reunião de professores que orientam monografia e, ao ligar o computador para ler as notícias do dia, deparo-me com o insólito destaque, logo na home page da Folha Online:

"PERFEITA - Homem constrói esposa robótica"

Como na reunião em que acabara de participar surgiu uma discussão paralela sobre a existência de novas teses jurídicas sustentando a existência de um "direito dos animais", a leitura da notícia sobre a robô Aiko (sim, ela tem nome!) trouxe-me à mente o seguinte pensamento: uma vez que há quem sustente que animais podem ser sujeitos de direito, logo poderemos nos deparar com a existência de um direito dos andróides. Confesso que a primeira tese me soa algo absurdo até mesmo em termos conceituais, mas talvez isso seja fruto de minha falta de atualização quanto às modernas tendências da Teoria Geral do Direito...

A robô Aiko é uma mistura de silicone, fios, motores, circuitos e um software de Inteligência Artificial. A "moça" conversa (veja vídeo), lê jornais para seu "marido" e criador, fala dois idiomas (inglês e japonês) e ainda limpa a casa. Não come e não dorme. Se algum dia animais forem reconhecidos como sujeitos de direitos, talvez Aiko também possa vir a postular os seus... Afinal, está mais próxima da forma humana, que o Direito Romano exigia como pressuposto da personalidade, e da capacidade de manifestar sua vontade do que a imensa maioria do gênero animal.

Em "Blade Runner", um clássico da ficção científica, andróides se rebelam contra sua condição, análoga à de escravos, e a pouca duração de suas vidas. Reivindicam seus direitos. E numa das cenas mais chocantes (para os padrões estéticos dos anos 80, pois talvez hoje seja mais "leve" do que alguns desenhos infantis...), de forte conteúdo simbólico, um deles se encontra com seu criador, pede mais tempo de vida... e o mata horrivelmente.

Se Aiko é feita de compostos inorgânicos e age por Inteligência Artificial, mera simulação por software que reproduz uma vontade pré-programada por algum humano, os andróides de Blade Runner eram biologicamente construídos, órgão por órgão (será que o desenvolvimento da pesquisa em células tronco um dia chegará a isso?), tinham uma inteligência "natural" e, isso era a fonte do problema central do filme, acabavam por desenvolver uma vontade própria, a ponto de se rebelarem. Se algum dia porventura produzirmos algo assim, biologicamente iguais a nós mesmos, será sem dúvida um dilema ético e filosófico terrível negar-lhes a condição de sujeitos de direito. "Blade Runner", sob o manto da ficção científica, é no fundo uma sofisticada paródia sobre a nossa difícil relação com a morte e sobre a exploração do homem pelo homem. Mas seu lado ficção parece estar se aproximando de nossa realidade.

Contudo, atribuir a condição de sujeito de direitos a animais é mesmo uma idéia difícil de assimilar. Mesmo porque proteção à Natureza, que também a mim interessa, não exige este tipo de ginástica conceitual. Se atribuímos personalidade jurídica aos bichos, fica difícil excluir a situação de Aiko; ou, se o aspecto humano também for dispensável, a qualquer sistema informático mais sofisticado, que simule inteligência e vontade. Pode ser melhor não usar seu GPS à noite, ou a "mocinha" que lhe dita o caminho poderá exigir horas extras e adicional noturno...

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