A morte precoce de Steve Jobs, fundador da Apple, ganhou amplo destaque nos meios de comunicação - e nas redes sociais - nesta última semana. Se a morte é sempre impiedosa, o passamento do dono de uma mente brilhante, no auge de seu sucesso, rico e no comando da mais lucrativa empresa de tecnologia da atualidade, não poderia deixar de causar um imenso impacto econômico-emocional nesta nossa sociedade digital.
Mas, enquanto a imprensa punha em destaque sua carreira empresarial, umbilicalmente ligada ao vertiginoso sucesso da empresa que fundou, a questão que me veio à mente é a que consta do título acima: por que neste nosso país, em cujo solo "em se plantando tudo dá", segundo escreveu nosso primeiro puxa-sacos oficial, Apples não florescem? Onde estaria a tão propalada criatividade do brasileiro?
Seria possível culpar o nosso clima tropical, inesgotável fonte do prazer e da preguiça? Linus Torvalds, o criador do Linux, ao explicar por que um jovem saudável de dezoito anos (a idade que ele tinha quando começou sua aventura) ficou trancado em seu quarto por várias semanas escrevendo um complicado sistema operacional, fez questão de esclarecer como é o inverno na Finlândia, sua terra natal. Segundo diz, é quase impossível sair de casa. Alguns lêem livros, outros assistem à TV... ele preferiu "brincar" de escrever um sistema operacional no seu computador. Se fosse brasileiro, Linus teria trocado o desenvolvimento do Linux por uma boa praia, futebol, samba e cerveja gelada?
Mas se o problema fosse o calor, por que ao menos nos climas temperados dos estados do sul, na serra gaúcha, ou na catarinense São Joaquim, onde maçãs crescem tão bem na temperatura amena, não surge uma Apple, ainda que menos suculenta ou vistosa?
Para tentar responder a esta pergunta, faço uma ligeira regressão no tempo. Voltemos para 2001. O Governo Federal havia baixado a polêmica Medida Provisória 2.200, que criou a não menos polêmica ICP-Br, que centralizou, burocratizou e encareceu o uso de certificados digitais em nosso país. A OAB-SP, por sua Comissão de Informática, então presidida pelo colega e amigo Marcos da Costa, promoveu um amplo debate sobre a recém criada MP, ao qual compareceram, pelo que minha memória permite recuperar, além de profissionais de diversas carreiras jurídicas, cientistas da Sociedade Brasileira da Computação e, claro, representantes do Governo, a fim de defender a sua criação.
E um emissário do Governo naquele debate disse algo que eu jamais esqueceria: sustentou que a MP 2.200 era necessária para evitar o surgimento daquilo que ele chamou, literalmente, de "empresas certificadoras de fundo-de-quintal". Aprendi com ele, enfim, qual é a ratio que orienta o Estado brasileiro!
Algumas das maiores empresas do mundo contemporâneo, no setor de tecnologia, nasceram em uma garagem! Hewllet-Packard, Microsoft, a própria Apple são vistosos exemplos. Não sei dizer se tais garagens ficavam na frente ou no fundo do quintal... O Facebook, sucesso mais recente, nasceu em um quarto de alojamento universitário.
Mesmo na área de certificação digital, a Thawte também brotou em uma garagem na Africa do Sul, em 1995, tornando-se em alguns anos a segunda maior empresa mundial neste segmento, até vir a ser incorporada pela primeira, a Verisign, em 1999, em um negócio na casa do meio bilhão de dólares. E não precisou de uma ICP governamental para andar para frente. Tenho a sensação de que a ICP-Br atrasou a utilização de assinaturas digitais no Brasil por pelo menos uns cinco anos, embora, claro, o establishment brasiliense insista em sustentar o oposto, isto é, que estão modernizando o país ao obrigar velhinhos octogenários a usar assinaturas digitais sem qualquer noção de seu funcionamento, utilidade ou dos riscos agregados.
Para o Brasil, é feio ser chamado de "fundo-de-quintal". A expressão é em si pejorativa. E a burocracia estatal, com sua sufocante carga de tributos, formalidades, ineficiência e corrupção, assegura o cumprimento dessa ética do atraso. É uma erva-daninha que impede o crescimento de qualquer coisa em seu quintal. Apples não nascem nesse solo ruim!
Se fosse brasileiro, Steve Jobs teria morrido sem conseguir quitar o REFIS.
2 comentários:
Para cultivar qualquer coisa, é necessário trabalho, bom solo, bom clima, e evitar ou controlar os predadores (as pragas, por exemplo).
Diferentemente das demais metáforas, na minha diria que temos trabalho, e o solo e o clima são bons.
O problema é o predador incontrolável.
Caro Pedro, obrigado pela visita e pelo comentário. Muito boa sua metáfora. De fato, o poder público no Brasil está mais para gafanhoto do que para solo ruim...
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